Crise!

Neste ano, também aprendemos as melhores formas de gerenciar crises, a partir de um trabalho sobre o comportamento da empresa Gol Linhas Aéreas, após o trágico acidente com um boeing da companhia, que vitimou cerca de 150 pessoas em setembro de 2006.

Acerca do ocorrido e do gerenciamento da então instalada crise, o trabalho culminou com um debate (que acabou gerando outra crise, estendendo-se muito além de sala de aula...) em que foram dispostas todas as ações que a companhia tomou para conseguir sair bem da situação.

Para exemplificar, a seguir um dos trabalhos apresentados, no caso, o meu. Como não perdi pontos por ele, acredito que, apesar de não ser perfeito, possa servir como referência de boas medidas a serem praticadas em situações de crise.

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GERENCIAMENTO DE CRISE: GOL LINHAS AÉREAS

A Gol Linhas Aéreas é um belo caso de sucesso no mercado de aviação. Fundada em 2000, por Constantino de Oliveira Júnior, começou a operar em 2001, tornando-se uma das empresas mais lucrativas do mundo, ao oferecer um serviço de qualidade a preços acessíveis. Isso fez com que grande parte dos usuários do transporte rodoviário migrassem para o aéreo, aumentando em três vezes o número de pessoas nos aeroportos.
Ao longo da história da Gol, empresas como Transbrasil e Vasp deixaram de existir, inclusive a Varig, adquirida pela Gol em 2007. Todo esse cenário fez com que a Gol logo ocupasse a segunda posição do ranking de concorrência, atrás apenas da TAM, líder do segmento no Brasil.
Infelizmente, em setembro de 2006, o brilhante crescimento da Gol foi abalado pelo trágico acidente ocorrido quando um jato particular Legacy colidiu com um moderno Boeing 737-800 da companhia, que ia de Manaus ao Rio de Janeiro, com escala em Brasília, e que caiu sobre uma selva de difícil acesso ao norte do Mato Grosso. Todos os 154 ocupantes, inclusive a tripulação, morreram no, até então, maior acidente da história da aviação brasileira.
O acidente transformou-se em uma crise que, se não fosse controlada, poderia ter dado fim à primorosa trajetória da Gol, afinal um acidente de tamanha proporção poderia criar um sentimento de pavor com relação à aviação nos passageiros clientes da empresa e até mesmo nas pessoas que jamais haviam voado, mas que poderiam vir a utilizar os serviços oferecidos pelas linhas aéreas. Além disso, poderia ser criada uma espécie de rejeição à companhia, pelo acidente ter ocorrido com uma de suas aeronaves.
A crise piorou a partir do momento em que as entidades federais ANAC, Infraero e Ministério da Defesa começaram a se manifestar sobre o acidente dando várias informações prematuras e imprecisas sobre o destino do voo e a impossibilidade de haver sobreviventes, ainda na noite do acidente, quando não se tinha nem certeza se o avião havia caído de fato. A confusão de informações, causada por uma lastimável falta de planejamento por parte destas instituições, deixava os parentes e amigos das vítimas cada vez mais irritados. Todos tinham a impressão de que ninguém sabia o que estava dizendo e a sociedade pressionava a Gol por respostas concretas.
A Gol, por sua vez, possuía uma espécie de “cartilha” para gerenciamento de crises e a seguiu religiosamente. Este manual tinha 2700 páginas e havia sido redigido com base no estudo de crises ocorridas com outras empresas de transporte aéreo que enfrentaram problemas com acidentes. Em menos de uma hora após o ocorrido, no prédio da empresa, a chamada “sala de crise” começou a preparar-se para os difíceis dias que estariam por vir.
Em primeiro lugar, a companhia, em momento algum, soltou informações que não fossem certas ou escondeu qualquer ponto da investigação. O local do acidente foi visitado pelos gestores da empresa para que fosse pensada a melhor maneira de ajudar no resgate dos corpos das vítimas e investigar o que causou o acidente. Até mesmo parentes das vítimas foram levados ao local do acidente para que fiscalizassem o trabalho do grupo de resgate. Eles também foram reunidos pela companhia em um único local para que fosse mais fácil a comunicação e o controle das informações. Os funcionários envolvidos com o gerenciamento da crise que estavam estressados com a situação foram afastados do trabalho para que não comprometessem o andamento dos planos. Os trabalhadores da Gol foram estimulados a seguirem com seus serviços normalmente e a empresa não deixou de operar em nenhum momento.
A companhia aérea ainda enfrentou por muito tempo após o acidente (e ainda enfrenta) problemas quanto ao pagamento de indenizações ás famílias das vítimas. A maior parte delas já recebeu os valores prometidos, mas algumas ainda tem processos em andamento e outras que receberam discordam dos valores pagos.
Apesar disso, podemos dizer com segurança que a Gol fez tudo o que era possível e correto para gerenciar a crise na qual se envolvera no último quarto de 2007. Após o turbilhão causado na época, pesquisas mostraram que 90% das pessoas que já haviam viajado ao menos uma vez pela companhia confiavam nela e a indicariam para outras pessoas. A Gol não perdeu a posição ocupada no mercado apesar do prejuízo com as indenizações e o processo de recuperação de sua imagem.
O acidente, entretanto, desencadeou uma outra crise, que desta vez atingiu toda a aviação brasileira. Com as investigações foram descobertos vários pontos cegos no mapeamento de aeronaves através dos radares das torres de controle e um suposto despreparo dos controladores de voo brasileiros. Isso acabou causando um decréscimo significativo na procura de voos e um prejuízo de milhões de reais às companhias aéreas. A situação se agravou ainda mais com o fatídico acidente de julho de 2007 com um Airbus A320 da TAM, que não conseguiu frear na pista do aeroporto de Congonhas, saiu da pista, atravessou uma avenida e chocou-se com um prédio da própria empresa, vitimando 199 pessoas, entre passageiros, tripulantes e civis. Tudo isso ocasionou o pior momento da aviação brasileira na história.
Aos poucos, a situação melhorou um pouco, mas está longe da ideal. Atualmente, a procura de voos é baixa, tendo até declinado nos últimos meses. Além disso, mais recentemente, um novo escândalo envolvendo o presidente da Gol, acusado de mandar matar dois de seus genros, corrompeu a imagem da crescente empresa.
Mesmo com todos os problemas, segundo dados de junho deste ano, a diferença na participação do mercado doméstico entre a Gol e a primeira colocada do segmento, TAM, é de apenas três pontos percentuais (45% para a primeira e 42% para a segunda) e a lotação dos vôos da segunda colocada é maior (60% a 57%).
Superar uma crise não é tarefa fácil, mas a Gol mostrou que é possível se a instituição estiver bem preparada. A causada pela tragédia de 2006 foi bem controlada, agora mais uma abala as estruturas da jovem companhia aérea. Resta saber se será feito um trabalho tão competente quanto o executado há três anos atrás.
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Uma pergunta: Será que a Gol teria se saído tão bem no gerenciamento da crise caso não tivesse trabalhado bem sua imagem nos tempos de "calmaria"?
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